domingo, 12 de novembro de 2017

Vídeo de 3 segundos de Waack serve para julgar uma vida?, indaga Mario Rosa




O apresentador William Waack, da TV Globo

Três segundos servem para julgar toda uma vida? Três segundos de uma frase que não foi ouvida podem determinar o fim de uma carreira profissional de décadas? Faço essas perguntas ainda assombrado com a armadilha que o destino pregou no jornalista e apresentador William Waack.
Waack construiu uma sólida trajetória como profissional. Foi correspondente internacional de jornais e revistas e, em sua encarnação televisiva, transformou-se num dos âncoras de maior credibilidade da telinha.
Eis que, às vésperas de uma entrada ao vivo na eleição norte-americana, pronunciou uma frase dessas, uma frase infeliz, uma coisa indevida sim, ok.
Confesso que já falei barbaridades muito piores, grotescas, asquerosas. Confesso, leitor; confesso, leitora: sou apenas um ser humano, pecador, falho e falo tolices —quando não as escrevo. Será que esta minha inconveniente confissão destruirá minha vida como abalou a de Waack? Clemência: é só o que vos peço!
Não estou aqui para defender Waack, embora o esteja defendendo. Minha questão é outra: estamos vivendo num tempo das certezas instantâneas. Onde foram parar as dúvidas? Onde foram parar as perguntas? Agora só temos respostas? E respostas rápidas e cabais? Julgamos uma vida, um destino, como se estivéssemos apenas fazendo uma postagem? O “outro” agora virou apenas isso: um pageview?
Waack é um ser humano, tem defeitos. E se você que está lendo for humano, também os defeitos dele são muito parecidos com os nossos. Mas as virtudes dele o tornaram uma das faces do nosso tempo.
Durante décadas, trabalhou com afinco e disciplina numa atividade de interesse público, como o jornalismo. Tem, portanto, uma lista longa de serviços prestados à sociedade. E agora, assim, de repente, é simplesmente deletado? Você gostaria que isso acontecesse com você?
Ok, ok, os afrodescendentes têm todo o direito de repudiar qualquer tipo de comentário racista. E todos os defensores da diversidade também. Estamos juntos nessa.
Mas… A única solução possível para um erro desse tipo, hoje, é a cadeira elétrica ou a guilhotina? Waack não poderia ter tido o direito de pedir desculpas, de se penitenciar, de dizer que cometeu uma tolice, de argumentar que entrar ao vivo é um momento de extrema tensão (fui repórter de TV e era péssimo em “ao vivos”,  sempre gaguejava, com a adrenalina de não poder errar).
Enfim, então, o destino das pessoas agora virou uma tuitada: 140 toques e uma sentença! De onde veio tanta certeza de que essa é a única saída para um caso como esse? Você acha que se sentiria julgado de forma justa, sua vida inteira, com uma tuitada?
E é bom deixar logo claro: não sou amigo de Waack. Cruzei com ele ao longo da vida e acho que ele tem um pé atrás danado em relação a caras como eu, que defendem pessoas que provocam asco ou estão na contramão da correnteza da opinião pública.
Então, não há aqui um compadrio. Há mesmo uma perplexidade e um esforço para nos perguntarmos mais e mais longamente ao invés de respondermos tanto e tão rapidamente.
Não estamos sendo cruéis demais com tudo e todos? Ouvir um pedido de desculpas e perdoar também não é humano e nobre? Não é o que desejaríamos para nós se cometêssemos um erro? Ou preferiríamos ser trucidados sem perdão? Onde foram parar as nossas dúvidas?
Já houve um tempo em que tinha respostas para tudo. Dai, cresci e fiquei cheio de dúvidas para todo o sempre.

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