sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

JOSÉ LACERDA

Litígio de limites entre MT e Pará (parte II)

A questão da demarcação da divisa com o Pará foi retomada pelo governo de Mato Grosso, impugnando juridicamente o último laudo pericial, emitido, no mês passado, pelo Serviço Cartográfico do Exército Brasileiro.

O impasse vem sendo questionado desde o levantamento realizado pelo governo mato-grossense em 1988, quando a Fundação Cândido Rondon apontou para a demarcação cartográfica equivocada feita pelo IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, no ano de 1971, com referência ao traçado da linha divisória do limite entre Pará e Mato Grosso. Essa linha divisória consta, oficialmente, até hoje nos mapas cartográficos. O equívoco está no ponto referencial do traçado, o qual fez Mato Grosso perder 22 mil km² de terras, equivalente a 2 milhões e 200 mil hectares.

Mato Grosso defende as bases da origem do Decreto nº 3.679, emitido pelo Congresso Nacional, em 1919, que resolvia definitivamente a questão, cuja delimitação do traçado teve como referência o acordo da Convenção de Limites entre os estados de Mato Grosso e Pará, assinado em 1900.

Tanto o acordo entre os dois estados, ratificado pelas respectivas assembleias legislativas e pelo Congresso Nacional, tomam como base dois mapas como referências: a de Oscar Miranda (1890) e a de Arthur Vianna (1898). Como o Rio São Manoel (Telles Pires) era desconhecido e pouco navegado, os cartógrafos tinham maior conhecimento com o Rio Tapajós, extremamente navegável. E a base da demarcação citada, no lado oeste, partia do Salto Augusto, situado no Rio Tapajós, que em linha reta tem como ponto extremo o Salto das Sete Quedas.

Entre os anos de 1895 - 1896, o explorador e cientista francês Coudreau, a pedido do Pará, reconheceu e recomendou o Salto Augusto como limite adequado para a solução do litígio entre Mato Grosso e Pará. Defendeu o paralelo que passa nesse salto como o limite natural em termos climáticos, étnicos e econômicos, considerando que os estados do Pará e Mato Grosso escolheram o acidente denominado “Salto das Sete Quedas” em virtude do alinhamento latitudinal com o Salto Augusto, no rio Juruena.

Nas cartas de Rondon (1921 e 1922), o marechal seguiu fielmente o texto da lei, identificando o Salto, as cachoeiras e os limites estabelecidos.

No Decreto federal de 1919, tomou-se o Salto das Sete Quedas, como referência, partindo da parte mais meridional até a margem esquerda do Araguaia, no ponto fronteiro mais setentrional da Ilha do Bananal. E a referência do Salto das Sete Quedas (que o perito intitulou Salto Quedas do Norte) era o traçado de linha reta a oeste, que dava no Salto do Augusto, no Rio Juruena (localizado na latitude 8º 53’ S).

Na época da demarcação, o IBGE fez a interpretação do decreto federal nº 3.679, baseando-se no laudo de pericial do Clube de Engenharia do Rio de Janeiro, do ano de 1922, o qual discordou dos mapas antigos. O ponto básico da discórdia é o não reconhecimento pelos peritos de alguns acidentes geográficos existentes nos mapas antigos, alegando que apresentam imprecisão quanto ao traçado dos paralelos, meridianos e coordenadas dos acidentes geográficos.

Porém, no último laudo pericial do Exército Brasileiro, o perito contraria suas argumentações no próprio documento, ao reconhecer que o Salto Augusto era bem conhecido no final do século XIX. Aponta que o paralelo desse salto recomendado por Coudreau é um limite natural e que os representantes do Pará e Mato Grosso conheciam estas coordenadas na época, entre outros pontos.

As contradições e a deficiência de fundamentação contidas no laudo pericial, bem como as citações sobre impressões pessoais do perito, foram as bases para a impugnação do laudo, solicitado pela Procuradoria do Estado.

Pior que a deficiência de argumentos técnicos, é a situação de não acatar as leis estaduais e federais para a elaboração do mapa cartográfico oficial, como seguido fielmente nas cartas do marechal Rondon na década de 1920.



* JOSÉ LACERDA é secretário-chefe da Casa Civil do governo de Mato Grosso

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